Maria do Arraial: Lendas e Histórias sobre o progresso de BH

A história de Belo Horizonte é rica em narrativas e eventos que moldaram a cidade e sua cultura. Desde lendas urbanas até a mudança de capitais, esses elementos revelam muito sobre o passado e presente da cidade. Neste post, vamos explorar a lenda de Maria do Arraial (ou Maria Papuda), uma figura marginalizada na sociedade de Belo Horizonte, e como a transferência da capital de Minas Gerais de Ouro Preto para Belo Horizonte impactou os moradores locais.

Além disso, analisaremos o livro “O Calibã e a Bruxa“, de Silvia Federici, conectando seus temas à história de Maria do Arraial e ao tratamento das mulheres durante a construção da nova capital. Essas histórias revelam a complexa interação entre capital, estado e marginalização das mulheres ao longo da história.

A lenda de Maria do Arraial em Belo Horizonte

Maria do Arraial: Lendas e Histórias sobre o progresso de BH
Maria do Arraial em sua casa

Maria do Arraial, cujo verdadeiro nome é desconhecido e que é conhecida como Maria Papuda, é uma figura lendária em Belo Horizonte.

Ela vivia nas ruas da cidade e sofria de bócio, uma condição que causa o aumento da glândula tireoide, resultando em um inchaço no pescoço. Esse inchaço deu origem ao apelido pejorativo “Papuda”.

Sua condição a tornou alvo de rumores e preconceitos, perpetuando a lenda. Segundo uma pesquisa realizada pela historiadora Maria de Lourdes Teixeira, “Maria Papuda era uma figura trágica e ao mesmo tempo icônica, representando a marginalização dos doentes mentais e das mulheres pobres na virada do século XX” . Essa figura histórica representa a marginalização e a estigmatização dos vulneráveis na sociedade .

A construção da nova capital

A transferência da capital de Minas Gerais de Ouro Preto para o Curral Del Rey, que mais tarde seria denominada Belo Horizonte, no final do século XIX, trouxe mudanças significativas para a vida de Maria do Arraial e de muitos outros moradores. 

Segundo relatos do livro “História de Belo Horizonte“, de José Xavier Bicalho, o Arraial Curral Del Rey era um local tranquilo e de vida simples, com uma economia baseada na agricultura e pequenas atividades comerciais. No entanto, a construção da nova capital resultou na remoção forçada de muitos moradores das áreas rurais e vilarejos que foram desocupados para dar lugar à nova cidade planejada. 

Essa transformação urbanística não apenas alterou a paisagem física, mas também impactou profundamente a vida de Maria do Arraial e dos antigos habitantes, que foram desarraigados e forçados a se adaptar a novas realidades sociais e econômicas.

O Calibã e a Bruxa

O Calibã e a Bruxa“, de Silvia Federici, explora a perseguição histórica das mulheres durante a transição do feudalismo para o capitalismo. 

Federici argumenta que essa caça às bruxas foi uma forma de controle social e repressão econômica. De maneira similar, a história de Maria do Arraial reflete como a sociedade lidou com aqueles que não se encaixavam nos padrões estabelecidos, especialmente mulheres marginalizadas como ela. 

Sua história ecoa as temáticas de opressão e resistência presentes no livro de Federici, demonstrando como narrativas pessoais podem ser engolidas pelas forças estruturais do capital e do Estado.

O capital e as mulheres

Federici também discute como o capital e o Estado perseguem mulheres há séculos, um fenômeno evidente na construção de Belo Horizonte. 

A remoção dos antigos moradores, muitas vezes mulheres e famílias, foi um ato de violência institucional que privilegiou o desenvolvimento urbano sobre as vidas individuais, como a de Maria do Arraial. Esse processo refletiu a contínua exploração e marginalização das mulheres, perpetuando um ciclo de desigualdade e opressão que ressoa até os dias de hoje. 

A construção da nova capital exemplifica como o poder econômico e político frequentemente submete grupos vulneráveis, reafirmando as teorias apresentadas em “O Calibã e a Bruxa“.

A história de Belo Horizonte, com suas lendas e realidades, nos lembra da complexidade das transformações urbanas e sociais. Para entender mais sobre essas narrativas e suas implicações, confira o quinto episódio da nova temporada do FASE 2.


Fontes:

  1. Maria de Lourdes Teixeira, “A Marginalização dos Doentes Mentais na Virada do Século XX”
  2. Silvia Federici, “O Calibã e a Bruxa: Mulheres, Corpo e Acumulação Primitiva”
  3. José Xavier Bicalho, “História de Belo Horizonte”